sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

A GAROTA ENTRE ASPAS - 2



LÁGRIMAS DE SALIVA


Suzana chorava copiosamente há duas horas pelo fim de seu namoro de cinco anos com João Pedro, o homem de sua vida. O único que já conheceu e a quem tudo permitiu.

Na noite passada ela descobriu sua última infidelidade: uma colega nova do trabalho; moça bonita, mas simplória. Uma presa fácil. Suzana fecharia os olhos para o desvio de conduta, como fizera tantas vezes antes, afinal ele era homem e tinha suas necessidades, como ensinara sua mãe. Entretanto desta vez havia algo diferente na história: um anel, na verdade uma aliança.

Ele não a conhecia nem há três meses e havia lhe dado uma aliança!

Pior: a aliança era idêntica a que deu a Suzana dois anos antes, pois assim ele não levantaria suspeitas com aquele anel em seu dedo. Levou dois anos para dar a ela o tão esperado símbolo, e agora três meses para dar à outra! Quantas mais ele deve ter dado? Deve ter algo errado com ela, só pode ser. O que será que ela não lhe dava que ele precisava de outra? De outras? Tantas outras!

Tudo ficaria como antes não fosse a ingênua vagabunda mandar uma foto deles juntos num motel. O rosto dela não se vê, mas o dele sim. Não há a menor dúvida. Dela, apenas as curvas delicadas e as pequeninas tatuagens acima do cotovelo. Usava uma camisola idêntica a uma que ele lhe dera de presente há alguns dias! Será a mesma? Ele seria tão repugnante assim?

Suzana sentia-se um lixo, mas Estela, sua amiga de faculdade a confortava. Dizia que era melhor assim: descobrir agora do que sofrer mais tarde e não conseguir se desvencilhar de um sanguessuga de emoções. Não deveria acreditar em suas desculpas nem em suas lágrimas de saliva, disfarçadas. Deveria agradecer por ter trocado o telefone por um número tão parecido com o dele, a ponto da amante distraída mandar a mensagem para o número errado e calhar de cair em suas mãos, como a prova de que precisava para ter força suficiente para escapar dessa história sem futuro.

O futuro, inclusive, reservava o troco para caras como o João Pedro... O futuro, e certa garota que, disfarçada, confortava mais uma vítima liberta dos machistas infiéis.

 


Um comentário:

"O essencial é invisível aos olhos"