segunda-feira, 30 de maio de 2016

EDUCAÇÃO DOS FILHOS ANTES E AGORA - 1) DINHEIRO


É incrível o quanto se diz hoje em dia que os tempos bons são outros - aqueles que não voltam mais -  entretanto, pouco ou nada se faz para tentar ao mínimo reproduzir o que foi bom. Não devemos viver com a impressão contínua de estarmos no tempo errado ou nunca conseguiremos aproveitar as qualidades do presente. É preciso entender que apesar das coisas boas, as condições eram outras e nós também: estávamos do outro lado do livro de histórias, éramos as crianças e hoje somos os pais. Aliás, quantos de vocês contam ou lêem histórias para os seus filhos hoje em dia?

 

Este texto, na verdade esta série de três textos, tem por objetivo apontar algumas diferenças na criação dos filhos, de Antes e Agora, não para lhes ensinar o que é correto a ser feito, mas para ver de outra forma, sob outra perspectiva e tornar suas reclamações vazias ou fundamentadas.

 

Não tenciono esgotar o tema neste texto, até mesmo para expandi-lo posteriormente com a ajuda dos leitores, enfim: 


O DINHEIRO E A INSTAURAÇÃO DOS VALORES

 

Não desejo para meus filhos a pobreza do meu passado, mas insisto em repetir os valores aprendidos nele.

 

Crianças eram apenas crianças, e não pequenos adultos. Tinham tanta liberdade de escolha quanto os pais permitiam ter e não o quanto elas próprias o decidiam.

 

Ao ir a um restaurante, minha mãe dizia “você vai sentar ali, seu irmão lá e sua irmã aqui”. Hoje os pais dizem “Onde vocês querem sentar?”. Parece besteira ou exagero querer regular isso, mas ao escolher onde sentáríamos, minha mãe sabia quem precisava ter mais perto de si, quem precisava ficar onde ela podia vigiar bem, por saber do nível de traquinagem, e quem poderia deixar relativamente livre sem que os outros soubessem disso.

 

Ela olhava o cardápio por um tempo e dizia “Vamos comer isso e isso”. Hoje se diz “O que vocês querem comer?”. O ato relevante aqui é que quem pagava era ela, logo sabia dos limites financeiros desta refeição com relação ao restante do passeio, além disso, ao escolher, garantia que todos se alimentassem de verdade, ao contrário de hoje, pois ao permitir que as crianças escolham livremente, normalmente pedem apenas uma das opções de mistura ou acompanhamento, isso quando já não partem direto para a sobremesa, alegando nem estar com fome (mas é só sair do restaurante ou chegar em casa que anunciam que querem comer).

 

Normalmente na hora da sobremesa, minha mãe lia em silêncio a lista com mais de dez possibilidades e dizia “Tem isso ou isso para cada ou ainda aquilo para dividir. O que vocês querem?”. A escolha sempre existiu, mas de forma controlada. Desperdício nunca foi uma escolha. Sempre foi preferível repetir, comprar de novo, a deixar sobrar e não conseguir aproveitar.

 

Cresci com crianças que foram educadas com o valor do “Ter”: era pedir que os pais davam, simples assim. Hoje estas pessoas ou estão do lado errado da lei ou estão tão envolvidas em dívidas que duvido muito que consigam dormir tranquilamente todas as noites sem o fantasma de algum credor lhe assombrar.

 

Eu cresci com o valor do “Conquistar e Merecer”: tinha de me comportar, ir bem na escola e ajudar com alguma pequena tarefa de casa, aí os mimos vinham. Mas se engana quem pensa que era só escolher e o presente chegava, nada disso. A sabedoria instintiva e inocente de minha mãe ia muito além disso, pois a principal diferença entre o Antes e o Agora é o uso consciente da palavra “Não”. A ideia nunca foi inibir, proibir ou privar, mas valorizar a ocorrência do “Sim”. Eu e meus irmãos não podíamos comer doce todo dia, brincar na rua de baixo, comprar roupas da moda ou todo brinquedo diferente que aparecia na televisão e isso era um saco, mas quando minha mãe aparecia com uma guloseima, aquilo era como o espinafre do Popeye! Alegria pura! Quando ela nos presenteava com algum brinquedinho, não interessava quanto custou ou de que marca era, se era original, genérico ou artesanal. O que interessava é que um dia comum se coloriu com um mimo de quem nos amava.



Sempre tive o essencial de tudo e assim cada pequena melhora era uma grande vitória a ser comemorada. Hoje se quer tanto de tudo que as aquisições materiais deixaram de ser vitórias para serem “apenas mais uma compra”.



Acontece que alguns pais não percebem o motivo de algumas crianças se interessarem mais pela embalagem do que pelo próprio brinquedo. Não é a pompa, é o momento, a diversão - pura e simples – as possibilidades imaginativas e o mistério. Acreditem em mim quando digo que não é preciso comprar o brinquedo da moda que custa mais do que a compra de alimentos do mês; não é gastar dinheiro que faz a diferença, mas gastar tempo pensando em alegrar quem se ama.

Um comentário:

  1. É preciso estar atento para quais valores se quer transmitir aos filhos e minimizar, sempre que possível, a força do dinheiro. Lembro de um brinquedo que eu adorava quando criança: um revolver colorido, pequeno, que atirava bolinhas plásticas de diversas cores. Ganhei só um. Amarelo, cujas bolinhas verdes, azuis e vermelhas me encantavam sem igual. hahah Apesar de só ter ganhado um, perco as contas de quantas vezes só o olhei de longe, grudado na saia de minha mãe, clamando que me comprasse um. Ela sabia que precisávamos de outras coisas. E também que eu deveria merecer para tê-lo. Passei de ano e ganhei.

    Bom que os pais reforcem comportamentos positivos, ensinando com a partir disso uma série de lições implícitas (ganhou porque mereceu, esforçou-se e tirou boas notas; e não porque briga com o coleguinha na escola e de vez em quando faz birra em público). É preciso educar para a responsabilidade desde cedo - por conseguinte, isso exige responsabilidade, algo de que muitos infelizmente têm fugido em nossa sociedade...

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"O essencial é invisível aos olhos"